MP 759 de 2016 – Inovação e Desburocratização para uma melhor Governança de Terras

No final de 2016 foi publicada no Diário Oficial a MP759 (Medida Provisória), que criou novas regras gerais para regularização fundiária rural e urbana. Ela inclui medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais para regularização de núcleos urbanos informais – conhecidos como “favela” ou “área de invasão” – consolidados e existentes até o dia 23 de dezembro. Também atualiza leis como a 8.629/1993 e 11.952/2009, que tratam da reforma agrária e da regularização fundiária na Amazônia Legal. O objetivo desta medida provisória foi unificar e tornar mais rápida a regularização fundiária no país para os casos que já existiam, e dificultar a formação de novas áreas de invasão.

A principal crítica que tem sido feita é que o governo implantou essas regras por meio de uma Medida Provisória, sem discutir com a sociedade. Entretanto, a discussão está acontecendo no Congresso, tanto que os parlamentares já apresentaram mais de 700 emendas ao projeto. Além disso, mesmo a lei 11.977/09, que criou o Minha Casa MInha Vida, surgiu de uma Medida Provisória, e nem todos os seguimentos da sociedade foram ouvidos em sua formulação. Precisamos também reconhecer que a regularização fundiária é um tema urgente para o País, pois permite que outras políticas públicas de desenvolvimento econômico e social sejam implementadas.

Mudanças para imóveis rurais

Esta medida provisória, MP759, tem um espírito inovador, com a intenção de tornar o processo de Regularização Fundiária menos burocrático, mais acessível e mais rápido. No campo, possibilita que áreas fora da Amazônia Legal sejam regularizada nos moldes do Programa Terra Legal (Lei nº 11.952/2009). Ela autoriza o INCRA a conceder o título de propriedade aos posseiros em áreas de sua propriedade e da União, inclusive assentamentos, reconhecendo a boa-fé do ocupante e seu vínculo produtivo com a área ocupada.

Para evitar que o beneficiário venda a terra, foram estabelecidas restrições que evitam a reconcentração, como a proibição da venda por um período de 10 anos e que esta terra participe da formação de um novo imóvel com mais de dois módulos fiscais. Um módulo fiscal é uma unidade de medida, em hectares, cujo valor é fixado pelo INCRA para cada município levando-se em conta: (a) o tipo de exploração predominante no município (hortifrutigranjeira, cultura permanente, cultura temporária, pecuária ou florestal); (b) a renda obtida no tipo de exploração predominante; (c) outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada;  (d) o conceito de “propriedade familiar”.

Além disso, o artigo 3º autoriza o INCRA a doar áreas de sua propriedade, sem licitação. Isto em certa medida vem tendo bons resultados no Terra Legal, mas possibilita a destinação indevida dessas áreas dada a debilidade da governança de terras no país.

Outra inovação da MP759 é tratar de áreas rurais e urbanas de forma conjunta, levando em consideração o território nacional como um todo. Isso possibilita a regularização de imóveis situados na zona rural, desde que o núcleo informal possua ocupação e destinação urbana.

 

Mudanças para imóveis urbanos

Ao tratar da regularização fundiária urbana trouxe dispositivos inovadores, como:

  • o conceito de informalidade utilizando o termo “núcleo urbano informal”;
  • a “legitimação fundiária”, como modo originário de aquisição da propriedade;
  • a desburocratização dos procedimentos de aprovação e registro;
  • a criação controversa do “direito de laje”;
  • a possibilidade de arrecadação dos imóveis privados abandonados para fins de regularização fundiária, no caso em que o proprietário não detiver a posse e ser inadimplente com as obrigações fiscais da propriedade (IPTU e ITR).

Outro ponto que promete agilizar o processo de regularização fundiária é a realização do procedimento administrativo e dos atos de registro preferencialmente por meio eletrônico, conforme previsto nos arts. 37 a 41 da Lei nº 11.977/09, mas funcionando em âmbito nacional. Este meio será o Operador Nacional do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônicos (ONR), implementado pelo IRIB. A implantação do ONR requer a padronização dos procedimentos administrativos realizados pelos cartórios. Hoje cada estado tem o seu procedimento. Esta padronização deverá ser feita através de ação do Conselho Nacional de Justiça e Corregedoria Nacional ou pela criação de um Colégio Registral com caráter normativo.

 

Repercussão

As inovações e os novos institutos jurídicos foram bem recebidos no meio jurídico, inclusive pelo fato de que diversos deles já existem em outros países. Por exemplo, o Direito de Laje já é disciplinado por lei na Espanha, o que facilita o reconhecimento dos direitos imobiliários consolidados.

Portanto, a MP 759 de 2016 e sua regulamentação podem gerar incertezas no curto prazo. Mas, se forem garantidas as melhorias necessárias nos procedimentos de registros e uma efetiva fiscalização, é possível afirmar que, em médio e longo prazo, a medida provisória traz consigo grande potencial de melhora no ordenamento territorial e da governança de terras no Brasil,  aumentando assim, a segurança jurídica da propriedade.

O texto integral da MP 759 pode ser visto aqui.